segunda-feira, 7 de março de 2011
Momentos necessários...
Por Regina Teixeira da Costa
A alegria, o prazer e a necessidade de desfrutar momentos de pacificação das angústias, que às vezes subitamente nos assaltam, são ingredientes imprescindíveis para viver. E tais sentimentos só podem surgir quando podemos nos voltar para o novo, quando respondemos, de fato, pelo nosso desejo e construímos alguma coisa a partir dele. Para isso precisamos romper com uma série de repetições imperativas. Nossos padrões são viciados, nossos atos provocam resultados indesejáveis.
Ocorre frequentemente, talvez sempre, de nosso modo de pensar e conduzir as coisas, mesmo sem consciência disso, ir nos guiando de maneira a voltar para o mesmo. Nossos passos vão reproduzindo antigos caminhos, como se fossem novos, e só paramos quando chegamos no beco sem saída. E paramos porque não há mais para onde fugir. A prova dessas repetições inconscientes é o resultado.
Observem quantas vezes perdemos amizades pelos mesmos motivos! Quantas vezes procuramos parceiros tão diferentes e, ao final, encontramos uma imensa, porém sutil identidade entre eles? Quantas vezes perdemos emprego, nos desligamos deles tendo a sensação de que novamente fomos vítimas dos mesmos fatos e atribuímos a culpa aos outros? Quantas vezes nos fazemos de tolos para ganhar amor e mesmo assim não o recebemos? Quantas vezes abrimos mão de nosso desejo pelo outro acreditando ganhá-lo e, enfim, nada garante a posse desse amor e desse reconhecimento que esperávamos?
A vida é assim. Nem sempre encontramos reciprocidade porque as pessoas não são iguais. Nunca serão. Aceitar isso nos liberta de um aprisionamento terrível: esperar que a nossa felicidade venha do outro. Esperar que alguém chegue para nos salvar de nós mesmos não é algo com que possamos contar. Só nos trará frustrações cada vez maiores.
Mas isso não quer dizer que não precisamos de bons momentos para usufruir da vida. Precisamos andar pelo mundo olhando bem para tudo e observando que, além dos nossos medos, a vida é cheia de ofertas; precisamos saber reconhecê-las e nos permitir recebê-las. Quem não pode percebê-las queixa-se insatisfeito.
Só desvestidos de algumas de nossas inflexíveis e supostas crenças preciosas, de preconceitos, repetições e medos, podemos ficar contentes. Podemos então nos abrir para o novo, para o desejo, para aquilo que é importante para nós, mesmo nada significando para o outro. Podemos viver nossa própria vida sem ofertá-la ao outro para termos lugar em sua vida. Temos de ter lugar é na nossa!
Para que possamos nos apropriar dela, precisamos olhar para dentro, escutar e ser fiéis a nós próprios, sem concessões. Sem qualquer concessão a viver a vida dentro de pré-ocupações que a ansiedade impõe, quando somos obrigados, por nós mesmos, a nos submeter e nos dobrar diante daquilo que criamos sem saber contra nós mesmos. Toda essa armadilha vem das posições antigas que diante da família adotamos e repetimos.
Mas voltemos à alegria, ao prazer necessário para fazer valer a pena viver. Apesar de sabermos que a felicidade plena e constante é uma ilusão, devemos buscar pedaços dela, momentos possíveis. De qualquer modo, ao conseguirmos nos livrar temporariamente dos nossos próprios conflitos ou administrá-los, já obtemos grande alívio e nos sentimos felizes por um tempo. Para sermos felizes não basta esperar ou acreditar no destino. Certamente alguns têm mais sorte que outros, mas quem de fato pretende ser feliz precisa fazer acontecer. Precisa construir com suas atitudes essa possibilidade.
Sem alegria a vida pouco nos vale a pena. Sabemos que o princípio do prazer corresponde ao alívio de uma despesa psíquica, a uma redução do gasto de energia; ao prazer obtido do reconhecimento a uma alegria de poder, uma alegria de superação de uma dificuldade. Como disse Freud, a felicidade talvez seja encontrada quando moderamos nosso anseio por ela; se conseguirmos evitar o desprazer e uma parte do mal-estar existencial, já devemos nos dar por satisfeitos e felizes. Disse ainda algo fundamental: é impossível fugir à impressão de que as pessoas comumente empregam falsos padrões de avaliação – isto é, que buscam poder, sucesso e riqueza para elas mesmas e os admiram nos outros, subestimando tudo aquilo que verdadeiramente tem valor na vida. Daí não é difícil concluir por que tanta gente vive em sofrimento.
Fonte: Jornal Estado de Minas - 30 de agosto de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário